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segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Sociedade em Rede: cultura, globalização e formas colaborativas

                                                                                 Regina Helena Alves da Silva
                               
                                                                                 Diretora do Centro Cultural UFMG e
                   Professora do Programa de pós-graduação em Comunicação Social - UFMG


Índice

1 Globalização, identidades, interculturalidade
2 Redes colaborativas
3 Bibliografia

Neste texto buscamos entender como se constituem, em tempos de globalização, possibilidades de interação social a partir de novas formas de conectividade que possibilitam, a qualquer momento, nos conectar a qualquer pessoa, a um reservatório de da-dos e a processos de intermediação cultural-político-social. Essa multiplicidade de ca-nais permite uma nova forma de coletividade, um novo tecido tecno-social, uma rede de indivíduos em contínua comunicação.


Nos importa analisar por um lado, a formação de redes sociais e, de outro, as potencialidades de tais redes na promoção de novas formas de relação compartilhada que hoje se encontram potencializadas pelo o uso do que se convencionou chamar de novas tecnologias da comunicação.

A importância disso está associada à possibilidade de se criar novos coletivos sociais mais autonomizados. Nossa reflexão parte da formação do espaço social e dos efeitos das tecnologias de comunicação sobre o mesmo. A proposta está na fronteira entre a formação de redes sociais e os processos de sua transformação, dada a utilização de técnicas eletrônicas de comunicação. Trata-se, portanto, de entender o que são os coletivos na vida cotidiana e como eles podem se transformam na mediação de redes técnicas.

Nos propomos então a uma breve análise das possibilidades de conformação de redes so-ciais como forma de pensar redes sóciotéc-nicas como uma rede de elementos econô-micos, políticos, sociais, tecnológicos, cul-turais, onde não existe predominância de um elemento sobre o outro. Essas redes mostram que vivemos em um mundo no qual é im-possível dizer onde começa a dimensão téc-nica da realidade cotidiana e onde começa a dimensão social.

1 Globalização, identidades, interculturalidade

Grandes debates marcam hoje o campo da ciência, e mais particularmente das ciências humanas e sociais. O desenvolvimento tecnológico, as novas tecnologias e seus significados éticos e sociais; a globalização da economia e da cultura e as interseções global/local, com o reaparecimento dos gru-pos étnicos, o fortalecimento de fundamentalismos de várias ordens, a organização e luta das minorias oprimidas; a diluição das fronteiras e a reconfiguração dos grupos de pertencimento e os sentimentos identitários; a homogeneização e instantaneidade da in-formação concomitante à proliferação das formas comunicativas; a individualização da sociedade e personalização dos interes-ses, aliadas à busca das vivências grupais e reativação dos laços comunitários; a presentificação da temporalidade contemporânea e o obscurecimento da idéia de futuro são temáticas que, acolhendo contradições e marcando a diversidade desafiadora do contemporâneo, instigam o trabalho do conheci-mento.

Hoje, a globalização, os avanços tecnológicos e os efeitos sobre o trabalho, a constituição da sociedade informacional, a ocidentalização da cultura e superexposição da mídia, são processos contemporâneos que produzem mudanças nos modos de estar e sentir-se juntos, desarticulam formas tradicionais de coesão e modificam modelos de sociabilidade.

São várias as posições com relação a como conceituar ou mesmo estabelecer algum tipo de relação com a globalização. São diversas as narrativas desenvolvidas como suporte explicativo e vários os caminhos espaço-temporais de compreensão do que seria este “momento” da história. De uma maneira um tanto simplificadora – esta não é a discussão principal deste texto – temos posições que
“louvam” a possibilidade do mundo se conformar enquanto um só, como um todo homogêneo regido por regras econômicas, sociais, culturais e políticas únicas. Mas também e com freqüência temos acompanhado um certo repúdio à globalização que surgiu da preocupação de que culturas locais sejam suprimidas formas culturais hegemônicas associadas à expansão de políticas de mercado.

Esta posição percebe a globalização como uma imposição de uma “forma estranha de vida” a locais despreparados e desprotegidos e os coloca como impotentes por não terem nenhuma voz em decisões políticas. Para além disso, neste texto, é importante para nós entender a globalização como um
movimento espacial e temporal que tem pro-duzido um aumento expressivo do potencial de tensões sociais. Mas gostaríamos de lembrar que, por outro lado, a globalização pode também despertar um sentimento – aparente-mente contraditório - de potencial diante de novas formas de exercer a liberdade e a responsabilidade para melhorar condições de vida.

 Para, além disso, temos a consciência de que, com este potencial, emerge na vida cotidiana algo assim como uma identidade global, que coexiste de alguma maneira com a cultura local. Daí a necessidade, neste trabalho, de entendermos a questão da globalização em relação às culturas locais.
A cultura se encontra no centro dos de-bates contemporâneos sobre a identidade, a coesão social e o desenvolvimento de uma economia fundada em um tipo de saber, que tem levantado algumas questões: quem há de garantir a vitalidade do debate e o diálogo público que condicionam a criatividade co-letiva e a vitalidade cultural; como combinar a universalidade dos direitos com o reconhecimento dos interesses sociais e os valores culturais particulares; e, como pensar os
direitos culturais e a preservação e consolidação da diversidade cultural como parte in-separável da consolidação dos direitos políticos, econômicos e humanos?
Responder a estas questões requer um olhar multifacetado, uma perspectiva que pro-mova não apenas a união de fronteiras do conhecimento, mas que seja capaz de articular um rompimento das mesmas e ampliá-las propiciando o diálogo.

O surgimento das sociedades modernas transfere as relações sociais para um território mais amplo onde as fronteiras desa-parecem e, ao mesmo tempo, colocam à disposição das coletividades um conjunto de referências resultado da mundialização da cultura. Cada grupo social, na elaboração de suas identidades coletivas, irá se apropriar destas das mais variadas maneiras. A sociedade global, longe de incentivar a igualdade das identidades está marcada por uma hierarquia clara e injusta. As identidades são diferentes e desiguais porque as instâncias que as constróem tem distintas posições de poder e de legitimidade.

O ponto mais significativo deste processo reside na questão da constituição/construção das identidades das pessoas. As pessoas têm uma necessidade premente de pertencimento/reconhecimento em relação à comunidade ou grupo social no qual estão inseridas. Nesse sentido, a sua organização em torno de projetos comuns, sobretudo culturais, onde os indivíduos compartilham não só o mesmo território, mas seus interesses, suas necessidades, enfim desejos comuns é que se constitui neste processo de formação de identidade individual e coletiva.

Uma identidade cultural se constitui como síntese da construção de múltiplos significados distintivos, fruto de complexas inter-ações sociais que desenvolvem internamente cada grupo e em suas relações com outros, mediante as quais seus membros se unificam e se diferenciam dos demais. E, além de proporcionar elementos concretos de referência e comparação, resume o universo simbólico que caracteriza a coletividade, porque estabelecem patrões singulares de interpretação da realidade, códigos de vida e pensamento que permeiam as diversas formas de manifestação, valores e sentidos. Isso requer um sentido de pertencimento como forma de inscrição no universo simbólico de
uma dada coletividade, esse pertencimento é o elemento aglutinador e mobilizador de atividades e constitui um gerador de valores e de coesão para o grupo.

Hoje temos, uma profunda mudança na compreensão do que entendemos por diversidade. Até algum tempo diversidade cultural era entendida como heterogeneidade radical entre culturas, cada uma delas enraizada em um território específico, dotadas de um centro e de fronteiras nítidas. Qual-quer relação com outra cultura se dava como estranha/estrangeira e, concomitante, perturbação e ameaça em si mesma, para a identidade própria.

O avanço tecnológico dos transportes e da comunicação transformou o tempo e o espaço derrubando as barreiras que rodeavam as culturas. O processo de globalização que agora vivemos, no entanto, é ao mesmo tempo um movimento de potencialização da diferença e de exposição constante de cada
cultura às outras, de minha identidade àquela do outro. A tendência da globalização - um mundo
"uno", interconectado e interdependente - supõe simultaneamente e como parte de um mesmo processo, a reafirmação da diversidade cultural e das identidades locais e nacionais. Assim são fundamentais os es-paços que se constituem como sendo os de constituição de identidades, o da diversidade, do encontro com o estrangeiro, do re-conhecimento da distinção em "eu"e "os outros".

A diversidade marca territorialmente nossos espaços de viver a partir de formas de vida específicas que se refletem em patrões de comportamento diversos e, às vezes, em tensões e conflitos. A gestão destas tensões, a construção da convivência com o respeito à diferença são alguns dos desafios mais importantes que todas as sociedades enfrentaram ou têm enfrentado. A expressão concentrada da diversidade cultural, das tensões dela conseqüentes e da riqueza de possibilidades que também encerra estão coloca-das para nós como um desafio: encontrar os meios institucionais capazes de garantir o que chamamos de interculturalidade. O que seria essa interculturalidade? Uma forma de
entender essas questões é partir de um olhar que possibilita captar interações culturais que não são meras justaposições de grupos diversos mas que são possibilidades de ligações entre diferentes e às vezes conflitantes. Isso nos aponta caminhos, linhas, links, de construção de zonas de negociação.

São manifestações culturais diferentes que se interconectam por nós e laços de reconheci-mento sociais. Temos, hoje, lugares que são imensos caleidoscópios de padrões, valores culturais,
línguas e dialetos, religiões e seitas, etnias e raças. Modos distintos de ser passam a concentrar-se à conviver em um mesmo es-paço com uma abundância de opções simbólicas que propiciam enriquecimentos e fusões, inovações estéticas tomadas de mui-tas partes e amplas negociações para os dilemas compartilhados com conjuntos mais amplos como as cidades, as nações ou os blocos.

De acordo com o que afirmamos no início desse texto, os tempos atuais produzem, simultaneamente, o desenvolvimento de uma cultura de massa através dos meios de comunicação e o florescimento das chamadas culturas locais. Estes dois elementos da trans-formação cultural encontram um lugar privilegiado de debate e formam parte de um pro-cesso mais amplo de construção de identidades.

Podemos dizer que até pouco tempo tínhamos políticas educativas e de comunicação que ordenavam, a partir de discursos e narrativas únicas, a coexistência de grupos. As políticas que ordenaram nossas formas de agrupar, de dizer de interesses comuns, tinham uma diretiva. Agora como pensar uma política intercultural? Isso requer um duplo movimento de aprofundar o conhecimento de minhas referências culturais e das outras com as quais mantenho qualquer tipo de con-tato.

Hoje, emergem novas dimensões que diferenciam a idéia de identidade de outras épocas e se superpõem, confluem ou se desagregam, criando novos ou redimensionando velhos referenciais de identidade. A idéia de fronteiras perde progressivamente a claridade de seus limites, reinscrevendo-se em torno de limites difusos desde os quais se consolida a emergência de novas identidades. (Laurelli: 2004, p. 16)

Em um processo de constituição de identidades através de projetos culturais as pessoas vêm se organizando em redes alternativas ou redes de solidariedade social, como forma de se garantirem perante as relações sociais as-simétricas e na direção da constituição da sua identidade e acesso à cidadania.

Nessa perspectiva, entendemos como rede uma estrutura que apresenta a propriedade de conectividade. Através de seus nós ela tem, simultaneamente, a potencialidade de solida-rizar ou de excluir, de promover a ordem e a desordem. Além disso, é uma forma particular de organização, e no âmbito dos processos de integração, de desintegração e de exclusão espacial, ela aparece como instru-mento que viabiliza duas estratégias: circular e comunicar.

As redes são animadas por fluxos. São dinâmicas e ativas, mas não trazem em si mesmas seu princípio dinâmico, que é um movimento do social. Este é animado tanto por dinâmicas locais quanto globais. As redes estruturam à sua maneira o campo de forças das relações de cooperação e de antagonismo que estão presentes na sociedade humana. São de fato instrumentos de poder e de rivalidades para seu controle.

Elas são suscetíveis de funcionar como instrumentos de integração e de exclusão, na
linha direta dos processos de diferenciação. Além disso, as redes técnicas em sua re-lação com o território, evidenciam que essa relação é ambígua: ora a rede é “fator de coesão”, ela solidariza, ela homogeneíza; ora ela transgride os territórios, opondo às malhas institucionais suas lógicas funcio-nais. Nesse aspecto, a análise da evolução das redes, distinguindo sua infra-estrutura, seus serviços e seu comando, permite-nos superar esta contradição evidenciando que sua participação é essencial para a construção de novas escalas territoriais, ainda que seu papel não seja determinante, mas de acompanhamento, na estruturação dos territórios.

Para nos deslocar em direção a uma discussão sobre o sentido das redes colaborativas chegamos então a uma noção de território apresentada por Santos: “O território não é apenas o conjunto dos
sistemas naturais e de sistemas de coisas superpostas. O território tem que ser entendido como o território usado, não o território em si. O território usado é o chão mais a identidade. A identidade é
o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence. O território é o fundamento do trabalho, o lugar da residência, das trocas materiais e espirituais e do exercício da vida.” (Santos, 2002). Esse território, nos tempos atuais, começa a aparecer como multiescalar e progressiva-mente complexo, sujeito a múltiplos processos de identidade em suas formações sociais, as vezes fragmentado e fractal. (Laurelli: 2004, p. 16).

E a partir daí como o lugar de variados níveis de agregação e diferenciação podemos chegar a uma noção de identidade como aquilo que esta em diálogo com as instâncias mais próximas mas também com as em escala planetária, o que está em disputa e confrontação com o que está mais perto e
o distante, ou seja, a identidade não está mais reduzida a espaços e lugares conheci-dos. Hoje, identidade constitui-se de diferenciação e agregação e não pode ser vista só a partir do reconhecimento da experiência do outro mas também da experiência com aqueles muitas vezes desconhecidos, onde pode existir agregações, disputas, diálogos, ausências, não-encontro.

Portanto podemos entender as identidades como constituídas a partir de algum tipo de
relação, por interação. A partir do que já discutimos acima podemos entender cultura hoje como o lugar por excelência da constituição de territórios de negociação onde as identidades se constituem por diversas inter-ações e as diversas culturas interagem a partir de características bastante diversas. Esta interação pode ser entendida como uma comunicação intercultural que requer uma nova competência comunicativa e que possibilite o conhecimento de outras cultu-ras. Esta é a base para pensarmos a con-stituição de redes colaborativas: a partir de territórios de negociação e da comunicação intercultural.

Partimos da compreensão que não existe homogeneidade das redes e nas redes, mas, que elas são espaços de conectividade organizado pelo discurso, um espaço reticular que pode presidir algum tipo de sociabilidade à distância.

2 Redes colaborativas 

Duas questões podem ser vistas como funda-mentais hoje: a busca da pluralidade de manifestações que a sociedade engendra, especialmente no que diz respeito àqueles à margem dos processos interculturais, sociais e políticos; e, que tipo de enfoque dar a essa diversidade e a criatividade político-cultural, às experiências coletivas que conformam a história das práticas sociais, na busca de estabelecer uma troca com a comunidade, potencializando a produção cultural e a construção
da cidadania.

Para uma busca de resposta a estas questões nos é imposta uma outra pergunta: o que estamos chamando de cidadania aqui? À possibilidade de um indivíduo na sociedade em que vive acessar um conjunto de direitos políticos, civis e sociais e dentre os direitos sociais os chamados direitos culturais. Estes direitos correspondem, por exemplo, ao acesso à informação, à apropriação cultural e da comunicação, à memória histórica e à produção cultural. Esse conjunto de direi-tos compõe o que chamamos de cidadania cultural.

Essa noção de cidadania cultural é baseada na idéia de que o exercício da plena
cidadania passa necessariamente pelo exercício dos direitos culturais. A produção de
projetos culturais através de redes colaborativas pode elaborar meios realmente eficazes
que garantam a democratização da cultura e dos bens culturais, que, atualmente, estão restritos a uma parcela reduzida da sociedade brasileira.

Estar em rede, em tempos de globalização, é um processo no qual os indivíduos, num processo de interação, de intersubjetividade, de mediação cultural, buscam um re-dimensionamento do espaço público, ainda que, muitas vezes, de forma inconsciente. Toda cultura tem suas próprias práticas dis-tintivas para criar e manter redes sociais. Ao se pensar nas maneiras culturalmente apropriadas de usar tecnologias sociais o melhor ponto de partida são as pessoas: comunidades coerentes de pessoas e as maneiras como elas pensam e como podem se incorporar em processos sociais mais amplos. As tecnologias de rede em geral podem ser usadas para criar um espaço para as "comunidades
da prática", e para desenvolverem práticas culturais da comunicação.

O espaço mundializado deu lugar a uma maior visibilidade das culturas. O desenvolvimento das tecnologias de comunicação também desempenhou neste espaço um papel importante. Fez com que a proximi-dade das culturas tornasse a sua coexistên-cia muito mais palpável. Tem sido tecidas uma gama infindável de relações múltiplas que nascem entre as culturas quando estas
tomam umas das outras seus traços distintivos, quando se mesclam e se mestiçam partindo de seus traços específicos para integrá-los cada uma delas em seu espaço social e simbólico próprio.
A noção de rede colaborativa compreende o entrelaçamento de iniciativas sociais, articuladas em torno de propósitos comuns. Tal reticulação baseia-se na ação das células, organizações de natureza similar ou diversa que se propõem a aglutinar esforços de maneira cooperativa, produzindo complementaridade aos trabalhos que vão sendo desenvolvidos.

Projetos culturais tem adotado a forma de redes como maneira organizativa capaz de promover interações entre as várias células, que podem estar interligadas de diversas maneiras. O alcance dos resultados espera-dos através do funcionamento das redes de-pende da configuração implementada, capaz de produzir a troca de informações e a articulação para a realização de objetivos comuns,
A estrutura das redes deve promover a participação dos indivíduos e instituições que a compõem em relações horizontais e colaborativas. Esses sistemas reticulares, construí-dos através de deliberações gestadas e to-madas de maneira participativa, constituem agregações de tipo comunitário, ou seja,
identificam-se com comunidades, sejam elas presenciais ou virtuais, podendo congregar indivíduos, grupos locais, regionais, nacionais e internacionais. Assim, a expansão das redes pode ser resultado de conexões com outras redes, garantindo as operações independentes de cada célula (nós ou links), a descentralização do processo decisório, através de multilideranças, e a capilarização dos
propósitos e ações comuns. Conciliada a essas possibilidades de proposições autônomas, a criação de produtos culturais através de redes torna-se um processo de experimentação artística e intelectual coletiva e abre es-paço para a diversidade cultural explicitando manifestações populares muito mais amplas e multifacetadas.

Muito se fala em democratização da cul-tura, mas dizer isso significa não pensar mais
a criação como um fazer isolado e sim como parte de um fluxo contínuo. Tem sido bastante discutida a idéia de autor (e não a de autoria) questionando a noção da possibilidade de existência daquele que trabalha e produz só. A partir disso se coloca a questão da propriedade particular em con-traposição ao benefício coletivo do conheci-mento e da cultura. Cada vez mais se faz presente a questão da disponibilização púb-lica do conhecimento e se enfatiza o coletivo, o grupo e a interdisciplinariedade. Isso nos traz uma outra possibilidade de entender co-letivo: cada um enquanto um sujeito plena-mente criador podem compor redes. Essas redes são de todos e todos podem se encon-tram em lugares concretos ou virtuais.

Enfim, este texto inicia uma reflexão sobre a importância de entender o ato da comunicação como um dos sentidos que estão no cerne da globalização e da sustentação da diversidade cultural. A comunicação é uma das vias pelas quais os indivíduos expressam sua identidade, opiniões e intenções, e as confrontam com outros indivíduos oriundos de contextos culturais distintos. Cada
vez mais escutamos falar em redes: sociais, sóciotécnicas, de comunicação, digitais, de
informação, etc.. Importante ressaltar é que todas essas possibilidades significam o com-partilhamento de identidades, a formação de laços sociais, enfim a constituição de nossa presença na sociedade a partir de formas co-laborativas de produção e de comunicação.

E, significam também, o entendimento do lu-gar da cultura para além de vê-la como uma forma de conhecer e planejar transformando-a em lugar de transformação e inovação. (Canclini, 2003)

3 - Bibliografia

ARANTES, Antônio (org.) O espaço da di-ferença. Campinas: Papirus, 2000.

CANCLINI, Nestor Garcia. A Globalização Imaginada. SP: Iluminuras, 2003.

CANCLINI, Nestor Garcia. Diferentes, de-siguales y desconectados: mapas de la interculturalidad. Barcelona: Gedisa Editorial, 2004.

CASTRO, Gustavo & DRAVET, Florence (orgs.) Sob o céu da cultura. Brasília: Thesaurus; Casa das Musas, 2004.

FEATHERSTONE, Mike. Cultura de con-sumo e pós-modernismo. São Paulo: Studio Nobel, 1995.

FRIEDMAN, Jonathan. Identidad cultural y proceso global. Buenos Aires: Amor-rortu editores, 2001.

LAURELLI, Elsa. Nuevas territorialidades: desafios para América Latina frente al siglo XXI. La Plata: Ediciones Al Mar-gen, 2004.

PRADO, José Luiz Aidar (org.) Lugar Glo-bal e Lugar Nenhum: ensaios sobre de-mocracia e globalização. São Paulo: Hacker Editores, 2001.

SANTOS, M. Território e Dinheiro. In: Pro-grama de Pós-Graduação em Geogra-fia da UFF. Território, Territórios. Ni-terói: PPGEO-UFF/AGB-Niterói, RJ. 2002. p.17 – 38.

3 comentários:

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  2. Este artigo me trouxe diversas reflexões, tantas que alcançariam a extensão de um artigo científico. No momento, pretendo me limitar há alguns trechos de discussão mencionados pela autora de forma bastante eficiente. Em decorrência do limite de 4.096 caracteres da plataforma Blogger, dividirei meu comentário em duas partes.

    Há bastante tempo temos discutido os impactos da globalização, sobretudo com o advento e popularização da internet, nas relações de trabalho. O temoroso e-commerce (ou simplesmente comércio eletrônico) tem sido o espaço que mais tem crescido em todo o mundo. No Brasil, por exemplo, segundo levantamento da E-Bit, empresa referência em informações sobre o comércio online, apenas em 2013 o setor eletrônico faturou R$ 12, 74 bilhões de reais no primeiro trimestre do ano, com um crescimento nominal de 24% em relação ao mesmo período de 2012, registrando 35, 54 milhões de pedidos (aumento de 20%), com um índice de satisfação de 85, 96%. No País, somos hoje mais de 46 milhões de consumidores virtuais e todos, absolutamente, são potenciais consumidores que poderão, no futuro, comprar por meio do serviço. O próprio mundo virtual, muitas vezes desprezado pela mídia que agora passa a produzir cada vez mais matérias sobre o tema, ultrapassou o “ambiente de entretenimento” e invadiu o esporte para surgir uma nova categoria denominada como esporte eletrônico (eSport). Com isso, e como se não bastasse, criou uma complexa rede comercial que se espalha mundialmente e levanta a problemática de como os mundos virtuais e o multiplayer online battle arena – MOBAs – acabam por borrar as fronteiras entre as definições entre jogo, trabalho e lazer, formatando uma economia do jogo que tem sua base no consumo compartilhado de produtos e serviços do e no mundo virtual.

    A respeito desse "momento" da história que vivenciamos hoje, argumenta-se que vivemos uma nova era, um novo tipo de sistema social que vem sendo chamado por inúmeros termos, como a “sociedade de informação”, “sociedade de informação”, a "sociedade em rede" ou a “sociedade de consumo”. Estaríamos, assim, no limiar transitório de um estado social que está alcançando um fim para além de um contexto que precede a situação social. Alguns autores classificam esse novo momento como uma “pós-modernidade” ou "pós-modernismo", com o faz Jean-François Lyotard, cuja abordagem foca questões de filosofia e epistemologia. Outros criticam-no, como fizeram Fredric Jameson e Anthony Giddens, procurando compreender o pós-modernismo como fenômeno social, com destaque cultural e também epistemológico.

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  3. Hoje, os processos comunicacionais estão cada vez mais complexos; o próprio avanço da globalização aumentou a preocupação e o embate entre a cultura local e a cultura global. O grande medo, antes, era que o local sucumbisse perante a força comercial da cultura hegemônica, o global. Assim que foi possível, com o avanço das indústrias internacionais em territórios nacionais, logo percebemos que as relações não se desdobrariam dessa forma apocalíptica como foi tratado o movimento. Pelo contrário, o que temos observado é que o modelo global teve que, muitas vezes, se “localizar” para adentrar em territórios estrangeiros – de imediato cito a atuação de algumas empresas, como a Coca-Cola e do banco Bradesco, na cidade amazônica de Parintins, dividida pela tradicional linha imaginária que cria a zona azul (Boi Caprichoso) e a vermelha (Boi Garantido) na cidade conhecida por sediar o Festival Folclórico de Parintins, que precisou modificar suas tradicionais cores vermelhas para poder se adequar aos consumidores dessa localidade específica.

    Partindo para uma esfera mais virtual, mais especificamente os mundos virtuais (ambientes simulados, com complexas mitologias e habitados por milhões de usuários), objeto de minhas pesquisas ultimamente, tenho observado que algumas empresas possuem um certo respeito ao se apropriarem de uma tradição de um povo e representá-la nesses espaços. Contudo, o propósito da maioria das empresas que administram jogos online não é tanto de preservar tradições culturais, mas de unir as peças da cultura de maneira inovadora e economicamente rentável. Isto porque a cultura passa a ser vista crescentemente como um “recurso”, como a denomina o pesquisador George Yúdice em seu A Conveniência da Cultura. Todo esse processo responde ao uso da cultura na era global, na esteira do que Jeremy Rifkin nomeou como “capitalismo cultural”. Mas nem tudo é desfavorável, essas “novas mitologias”, como nos lembra Henry Jenkins, aproximam consumidores e jogadores de volto à mitos antigos, colocando-os novamente em circulação. Este movimento Durand classificou como o retorno do mito nas sociedades contemporâneas.

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